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Aos poucos, começam a ficar claras as causas profundas do desastre que já matou mais de 800, no Rio de Janeiro |
Por Antonio Martins, jornalista, no "Outras Palavras"
Ao visitar a região serrana do Rio de Janeiro, em solidariedade às vítimas das chuvas, a presidente Dilma Roussef tocou numa ferida aberta. Indagada sobre as causas da tragédia, ela apontou a falta, “há décadas” de programas que assegurem o direito à moradia. É devido a isso, frisou ela, que a população empobrecida “vai morar onde não pode”. O efeito da fala sobre os jornais foi curioso. A crítica social de Dilma não foi destacada por eles, como seria de prever. Mas cumpriu papel dissuasório: refreou a tentativa (liderada por O Globo) de culpar o governo federal, alegando não-liberação, em 2010, dos recursos do Orçamento da União destinados a contenção de encostas e transferência da população que vive em locais de perigo extremo.
Como sugeriu a presidente (sem usar as palavras), as causas principais das mortes e devastação são a desigualdade e o adiamento eterno da reforma urbana. Mas os fatos que emergiram nos últimos dias apontam um outro fator importante. A debilidade e ineficiência do Estado brasileiro — União, Estados e Municípios — contribuíram para o desastre. É pauta para uma reportagem de fundo, que poderia partir dos dados a seguir.
O Valor Econômico revela, hoje, que PAC reservou, em 2010, 1 bilhão de reais para as obras capazes de evitar desmoronamentos ou proteger a população. Desse total, apenas R$ 320 milhões foram investidos. Mas a causa principal é a ausência de projetos. As prefeituras, a quem cabem as obras, simplesmente não foram capazes de apresentar propostas que justificassem o uso dos recursos. Dos 99 municípios considerados áreas de grande risco (e por isso beneficiados pelas verbas), menos da metade encaminhou projetos.