Na conta dos ministros
Executivo exige que titulares de pastas cobrem de suas bancadas no Congresso a aprovação do piso nacional de R$ 545 na votação de amanhã e Carlos Lupi fica em saia justa
Autor(es): Ivan Iunes, Igor Silveira, e Leandro Kleber - Especial para o Correio
Correio Braziliense - 15/02/2011
A determinação dada pelo Palácio do Planalto para que os ministros convençam suas bancadas a votar o salário mínimo de R$ 545 estabelecido pelo governo colocou em uma encruzilhada o titular da pasta do Trabalho, Carlos Lupi. Presidente licenciado do PDT, ele foi o único entre os colegas a declarar publicamente ser favorável aos R$ 560, fruto de um acordo costurado pelo partido com as centrais sindicais e a oposição. Pressionado pelo governo, que não admite dissidências, ele mudou o entendimento, ainda na semana passada, e hoje reúne a bancada do PDT, às 10h, para tentar fazer com que deputados e senadores da sigla sigam a cartilha do Executivo, embora saiba que dificilmente a legenda aceitará o valor estipulado pela equipe econômica. Antes desse compromisso, Lupi se encontra com a presidente Dilma Rousseff, que deve reforçar a cobrança.
Além do PDT, existe o receio de que outros partidos oficialmente fechados com a proposta governamental apresentem altos índices de traição na votação em plenário. Até mesmo o PT, sigla de Dilma, ameaça ir rachado para a votação, pelo menos no Senado.
Sob a mira dos cortes nos gastos da administração pública, os titulares de pastas com orçamentos generosos na Esplanada correram para reforçar o reajuste do mínimo defendido pelo Planalto. “O PMDB é um aliado do governo e é nessas horas que deve haver solidariedade entre os aliados”, disse o ministro da Previdência, Garibaldi Alves Filho. O ministro de Relações Institucionais, Luiz Sérgio, reforçou que o Palácio do Planalto não trabalha com outra hipótese que não seja a aprovação do mínimo de R$ 545. “Não acreditamos que os aliados faltarão ao país nesse momento importante que estamos vivendo. Temos uma relação de confiança.”
Como resposta aos apelos do Planalto, Lupi marcou uma reunião com os 26 deputados e quatro senadores do partido em um hotel no centro do Plano Piloto. O encontro concorrerá com a exposição que o secretário executivo do Ministério da Fazenda, Nelson Machado, fará aos parlamentares sobre a necessidade de se aprovar o piso salarial proposto pelo Executivo. A intenção do ministro é costurar uma saída estratégica para o PDT em plenário, a depender da disposição dos parlamentares de desistirem dos R$ 560 costurados pela legenda. Tarefa árdua, na visão de correligionários. “Lupi ficou em uma sinuca de bico. Como vai explicar o apoio ao mínimo do governo se na semana passada defendia o trabalhador no horário gratuito do partido no rádio e na televisão?”, questiona um deputado pedetista, que preferiu não se identificar.
Margem de segurança
O Palácio do Planalto aposta que terá pouco mais de 300 votos — são necessários 257. O maior receio do governo é que uma possível dissidência do PDT abra espaço para traições pontuais, reduzindo a margem de segurança.
No entanto, o líder do governo na Câmara, Cândido Vaccarezza (PT-SP), aposta que o reajuste proposto pelo Palácio do Planalto será aprovado com relativa folga. Mas reforça a ameaça contra os insurgentes da base. “Quem não estiver com o governo vai ter de se explicar. Não tem conversa aberta e não vamos mudar o que já havia sido acordado com as centrais sindicais, que era reajustar o salário para R$ 545”, alerta Vaccarezza. Pelas contas do governo, PT, PMDB, PR, PTB, PCdoB e PP devem votar integralmente na proposta oficial. O PSB anunciará posição amanhã e a expectativa é de que Lupi consiga convencer o PDT a embarcar na tese governista.
Hoje, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, falará na comissão geral criada pela Câmara para discutir o tema. Mantega deve debater as contas do governo com integrantes da base governista e da oposição. O Planalto descarta adiar a votação, prevista para amanhã, mesmo diante da ameaça de dissidências por alguns deputados de siglas aliadas.
Irregularidades
Além da pressão do Planalto, Carlos Lupi tem buscado se esquivar das suspeitas de irregularidades que recaem sobre a Federação Interestadual dos Mototaxistas e Motoboys Autônomos (Fenamoto), presidida por um aliado político de Lupi, militante do PDT. A federação recebeu R$ 1,5 milhão do ministério para capacitar 2 mil motofretistas no Distrito Federal, mas os cursos oferecidos são irregulares — a entidade não está cadastrada no Detran-DF. Outros R$ 4,96 milhões foram liberados para o sindicato dos mototaxistas de Goiânia, ligado à Fenamoto. Houve mais vagas do que procura, e o convênio precisou ser prorrogado. Todo o dinheiro já foi liberado.
ANÁLISE DA NOTÍCIA
Lupi na fogueira
Além de atrapalhar a intenção do Executivo de aprovar o salário mínimo de R$ 545, o comportamento dos parlamentares do PDT em plenário pode definir o futuro de Carlos Lupi na Esplanada. O Palácio do Planalto já deu indícios de que cada cargo no governo dado a aliados será cobrado com juros durante votações importantes. Os responsáveis por facilitar a caminhada governista no Congresso serão os titulares desses postos. Caberá a eles liderarem suas respectivas bancadas.
O teste de fidelidade do Planalto teve início com o titular dos Transportes, Alfredo Nascimento (PR). Durante a candidatura avulsa de Sandro Mabel (PR-GO) à Presidência da Câmara, ele foi pressionado pelo governo e conseguiu a abertura de processo de expulsão do deputado, que insistiu em concorrer. No caso da votação do mínimo, cada voto do partido com o governo reforçará a permanência de Lupi no cargo. A cada dissidência, é o pescoço do ministro que ficará a prêmio.
Conformado com a falta de disposição do Planalto em negociar concessões, Lupi falará hoje com os deputados do partido para expor um único quadro. Com maioria consolidada, a hipótese de o governo passar o trator sobre a oposição e os dissidentes na votação do mínimo é bem mais provável do que uma virada capitaneada por um partido com menos de 30 deputados. Com chances reduzidas de vitória em plenário, Lupi pedirá que os parlamentares esqueçam o mínimo. O voto de amanhã servirá mesmo para selar a permanência da legenda na Esplanada a partir da reforma ministerial marcada para o ano que vem. (II)
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