
Aposentadoria é coisa de vagabundo
Por Rui Martins (*)

Que beleza de argumento, até eu, sem maiores informações, poderia ser convencido. Há mesmo muitos trabalhadores franceses batendo palmas e dizendo - « é isso mesmo, é lógico, vivemos mais, temos de trabalhar mais ».
Mas calma, devagar com o andor, e toda aquela história, livros, artigos, conversa na tevê, na mídia, de que no futuro todos iam trabalhar menos com o desenvolvimento do lazer, viagens, coçação de saco, passeios, turismo ? Zebrou ? Onde é que eu perdi o fio dessa história ? pois eu achava que a redução das horas de trabalho na França para 35 semanais era justamente o começo dessa nova vida para os trabalhadores.
Ainda há alguns anos, quando a esperança de vida de um francês era de 65 anos, um metalúrgico, por exemplo, só teria 5 anos para gozar a vida, embora muitos já tivessem reumatismo, diabete, distúrbios vasculares e nem pudessem dar uma passada na Geni por impotência. Como o salário

A ilusão era a de que os filhos, esses sim, iriam aproveitar – menos horas de trabalho e mais lazer. E agora, antes de morrer, a desilusão – os filhos vão ter de ficar mais cinco anos na fábrica, no comércio, no trabalho.
E tem mais, a história de que o lazer para todos seria nosso futuro se baseava também no advento das novas tecnologias, na robotização de muitos trabalhos pesados e rotineiros. A máquina a serviço do homem, era o que se dizia. E quem acreditou se ralou. A robotização nas fábricas deu demissões e a máquina ficou a serviço do capital e contra o homem. Terceirização, robotização, globalização, a massa operária não irá mais ao paraíso porém ao inferno do desemprego e dos salários vis.
Essa história de aumento da idade para a aposentadoria tem outro ângulo geralmente esquecido – na teoria, diz-se que vivendo-se mais é normal se trabalhar mais, porém, quem ultrapassa os cinquenta anos, se perder o emprego já não acha outro. Ou seja, para as empresas quem tem 50 anos já não presta para o trabalho porque ficou velho; para os governos e fundos de pensões quem vive oitenta ou mais tem saúde e condições para trabalhar até os 65, 65 e 70 anos.
E é aí que os governos e fundos de pensões podem economizar e bastante – o empregado perde o emprêgo aos 55 ou 60 anos, passa a viver dois ou três anos com seguro desemprego, fica na miséria, deixa de contribuir para a caixa de pensões e não tem patrão também contribuindo. Quando chegar aos 67 ou 70 (como queria um ministro suíço e onde muitos países vão tentar chegar), sua média salarial já foi reduzida ao mínimo e terá uma aposentadoria de miséria.

Esta realidade de que idoso não acha emprego é simplesmente escamoteada pelas argumentações em favor do aumento da idade da aposentadoria. Resultado – criou-se nos anos 70 e 80, a esperança de um mundo robotizado, com 35 horas semanais, trabalho a domicílio, férias mais longas e, de repente, a especulação financeira, o grande capital assume o comando e decreta – sociedade do lazer ? O que é isso ? Vamos todos trabalhar e quem não conseguir segurar seu emprego depois dos 60 que monte uma barraquinha.
O capital financeiro perdeu os tubos, os países estão endividados, um socialista é que dirige o FMI, não tem mais moleza não minha gente, acabou o sonho. Robô, que não precisa de descanso semanal, nem férias e se contenta com uma corrente elétrica e um pouco de óleo, vai ter melhor tratamento que operário humano.
*Rui Martins é jornalista. Foi correspondente do Estadão e da CBN, após exílio na França. É autor do livro “O Dinheiro Sujo da Corrupção”, criador dos "Brasileirinhos Apátridas" e da proposta de um Estado dos Emigrantes. É colunista do site "Direto da Redação" e vive em Berna, na Suíça, de onde colabora com os jornais portugueses Público e Expresso, e com o blog "Quem tem medo do Lula?"
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