A presidenta e os preconceitos

Quero que saibam que tenho orgulho de ser governado por uma Mulher. Será tratada por mim como qualquer outro governante, mas com respeito e racionalidade. Quero também agradecer às mulheres que lutaram pelas conquistas femininas, porque as conquistas de vocês, mulheres, tornaram nossa sociedade como um todo melhor, inclusive para nós homens.

Por Gustavo A. Medeiros (*)

O homem mais importante do nosso país é uma mulher. Antes que eu seja alvo da fúria feminista, falei isso apenas para chamar a atenção de que estamos tão habituados a tratar o homem como referência do ser humano que, em alguns momentos, nós os tratamos como sinônimos: “O homem é a medida de todas as coisas” – Protágoras; “O homem é do tamanho do seu sonho” – Fernando Pessoa; “O homem é lobo do homem” – Thomas Hobbes etc. Pensamos sempre o ser masculino como ser humano padrão, tanto assim que queremos que as mulheres se portem como homem quando chegam ao poder consciente ou inconscientemente. De maneira esquizofrênica, outra hora queremos que as mulheres se portem de maneira mais semelhante ao que se espera de uma mulher, frágil, emotiva, “chorona” etc.

Por isso, deve causar, a algumas, pessoas estranheza um presidente homem carinhoso e “chorão” e uma mulher firme e contida. Não há nada de errado nisto, vivemos no século 21, esqueceram? Acho que muita gente esqueceu e muitas destas pessoas me mandaram mensagens apócrifas por e-mail com idéias do século XIX durante a campanha dizendo: “Como ela vai querer ser presidente do país se nem cuida da casa e da filha?” Primeiramente põe-se em dúvida se estas acusações são verdadeiras, o acusador por acaso conhece a família da então candidata para afirmar isto? Teve contato com a filha?

Supondo que seja verdade. Há outras questões, por que só as mulheres precisam saber cuidar da casa? Por que os homens não são orientados desde pequeno também a cuidar das tarefas domésticas? Segundo é por que quase não se fala dos homens que não dão atenção a família? Claro que devemos levar em conta que o trabalho em nossa sociedade exige tanto do funcionário que ele não tem tempo para família, mas este conceito é válido tanto para o homem quanto para a mulher.

Há no fundo no fundo a não aceitação dos novos tempos, além de uma certa maldade implícita em que se os nossos inimigos não tiverem defeitos, nós os inventamos, mesmo que esta invenção não seja propriamente um defeito. Isto aconteceu muito durante a campanha, fizeram uma biografia apócrifa, enviada por e-mail, supostamente inocente (que de inocente não tinha nada), falando que Dilma era lésbica. A intenção não era contar a estória dela, mas simplesmente inventar uma ou distorcer a original para estimular a homofobia, baseados em concepções machistas. Na cabeça tortuosa machista (que não é exclusividade dos homens), mulher firme e “durona” solteira deve ser lésbica. Não levaram em conta inclusive que ela se casou na clandestinidade. Quem se casa na clandestinidade, certamente não se casa para manter as aparências.

Como pessoas homofóbicas não votam em lésbicas, não votariam em Dilma também. Pura maldade, derrotar a candidata usando o que há mais baixo, o preconceito. A candidata na época não seria nem pior e nem melhor se fosse lésbica. Ser homossexual não é defeito, é uma maneira de ser. Para os machistas de plantão que em sua maioria não gosta de mulher (fazer sexo com mulher não significa gostar de mulher), devem saber que há diversos tipos de mulheres igualmente heterossexuais: as duronas, as meigas, as contidas, as expansivas, as carinhosas etc. Há mulheres muito femininas que são lésbicas também.

Assim, pelo fato de o presidente ter escolhido Dilma não significa que vai ser ele que vai mandar. Aí, certo programa de humor de uma certa televisão de grande audiência mostra a presidenta como uma mulher com voz de Lula, puro machismo e grosseria, o que tornou sem graça e antipático o quadro para talvez a maior parte da população. Fico imaginando Lula na piscina de São Bernardo com uma limonada na mão e um celular na outra, dando ordens à presidenta em
Brasília. Quer dizer que uma mulher que é tida por todo mundo como “durona” vai ser manipulada facilmente por uma pessoa que é tida como coração mole como o Lula? Mais fácil seria o contrário. Fora o fato de a distância física em si ser um impeditivo poderoso. Há nisto também a idéia de que uma mulher tende a não ter idéias próprias.

Aí, dizem que boa parte do ministério foi escolhida por Lula, pode ter havido alguma recomendação como qualquer um amigo o faria, mas imposição é algo bem diferente. A ex-chefe da casa civil no governo Lula era uma espécie de primeiro ministro que tinha funções gerenciais, na prática, era quem conhecia melhor os ministros e tinha mais contato com eles do que o próprio ex-presidente Lula (aliás, isto já mataria o argumento de falta de experiência de Dilma). Seria apenas uma questão de inteligência manter os ministros que trabalham bem.

Tudo isto o que eu estou falando é para mostrar que tudo está sendo feito seja de maneira aberta (como na grande imprensa), seja de maneira obscura (como nos boatos) para desqualificar a nossa presidenta, inclusive como mulher. É importante que cada um de nós defenda a nossa suprema mandatária da nação, rebatendo por e-mails, por blogs, cartas etc. as críticas injustas e preconceituosas.

Agora vamos reconstruir a nossa frase: O Ser Humano ou Pessoa mais Importante do Nosso País é uma Mulher.

Quero que saibam que tenho orgulho de ser governado por uma Mulher. Será tratada por mim como qualquer outro governante, mas com respeito e racionalidade. Quero também agradecer às mulheres que lutaram pelas conquistas femininas, porque as conquistas de vocês, mulheres, tornaram nossa sociedade como um todo melhor, inclusive para nós homens.

*Gustavo A. Medeiros é engenheiro e, a partir de hoje, integra a equipe de colaboradores do blog "Quem tem medo do Lula?".