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A Universidade de Coimbra justificou da seguinte maneira o título de Doutor Honoris Causa ao cidadão Lula da Silva: “a política transporta positividade e com positividade deve ser exercida. Da poesia para o filósofo, do filósofo para o povo. Do povo para o homem do povo: Lula da Silva”

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quarta-feira, 4 de agosto de 2010

E começa a temporada de debates eleitorais...

Eis os mais marcantes (ou mais ridículos)

Por Celso Lungaretti (*)

Debates eleitorais pela TV costumam ser extremamente tediosos, um mero entrechocar de imagens forjadas por marqueteiros como o Duda Mendonça, cujos cordéis movimentam os fantoches em cena.

São exceções irrisórias as situações pitorescas nesses debates. Eis algumas:

- quando Richard Nixon, ainda sem aquilatar a importância da imagem, foi ao confronto decisivo contra John Kennedy com a barba por fazer. Mais do que os argumentos, o eleitorado dos EUA comparou o garboso Kennedy ao mal-encarado Nixon, com os resultados conhecidos;

- quando um deputado dos mais obesos queria entregar alguns papéis a Jânio Quadros no ar e foi se arrastando grotescamente por baixo do ângulo captado pelas câmeras... sem imaginar que, maldosamente, elas se voltariam na sua direção, expondo a todos os telespectadores seu puxa-saquismo explícito;

- quando Franco Montoro esperou sua tréplica a Jânio Quadros, no encerramento do debate, para acusá-lo de torpeza (havia sido vítima da ditadura e estava mancomunado com os antigos perseguidores), de forma que suas tentativas raivosas de dar resposta foram rechaçadas pelo mediador, fazendo-o parecer destrambelhado e patético;

- quando Boris Casoy perguntou a Fernando Henrique Cardoso se ele acreditava em Deus e FHC se queixou de que haviam combinado não tocar nesse assunto, dando ao adversário Jânio Quadros um trunfo talvez decisivo para vencer uma eleição parelha;

- quando Brizola e Maluf perderam as estribeiras e ficaram se xingando no ar. "Filhote da ditadura!", repetiu várias vezes o gaúcho, enquanto o outro respondia: "Desequilibrado! Desequilibrado! Passou 15 anos no estrangeiro e não aprendeu nada!" (foto acima);

- quando Lula teve um apagão no debate decisivo com Collor e reagiu com apatia aos ataques do inimigo, não contestando sequer a afirmação de que seu aparelho de som era melhor que o do ricaço das Alagoas;

- quando o mesmo Collor, tentando voltar à tona depois de botinado do poder, foi escalado para formular uma questão ao folclórico Enéas Carneiro e, depois de pensar um pouco, desistiu: "Manda ele falar o que quiser". Enéas gastou seu tempo criticando o próprio Collor, que esnobou de novo o adversário ao ter a chance da réplica: "Manda ele continuar falando".

Lembrei-me de sete momentos interessantes num sem-número de debates a que assisti ou dos quais tomei conhecimento. Posso ter esquecido um ou outro mais. O certo é que a mesmice e a chatice predominam de forma avassaladora.

Eis um que marcou época

Debates eleitorais são recentes no Brasil, começaram em 1982.

E os que reúnem apenas dois candidatos vêm desde 1989, quando foi introduzido o segundo turno nos pleitos para presidente da República, governador e prefeito.


Infelizmente, já deu tempo para as assessorias especializadas capacitarem-se a preparar qualquer indivíduo que não seja um completo idiota para ter desempenho razoável nos debates, dando respostas decoradas para os questionamentos óbvios, driblando as questões inoportunas, lançando provocações para desestabilizar o(a) adversário(a), abusando das falsas emoções, etc.

Daí a previsibilidade que ora caracteriza os debates.

Mas, como a eleição 2010 está polarizada entre um homem e uma mulher, a chamada caçapa cantada para o 2º turno, vale darmos uma relembrada no primeiro grande debate televisivo entre os dois sexos, em São Paulo.

Não foi exatamente eleitoral: teve como contendores o diretor de trânsito Américo Fontenelle (foto acima) e a deputada Conceição Costa Neves, em 1967.

No governo de Carlos Lacerda (RJ), o coronel Fontenelle conseguira resultados excelentes por abordar o trânsito com metodologia sofisticada de diagnóstico e planejamento de ação.

Ao mesmo tempo, até por sua formação militar, era um atrabiliário ao colocar as medidas em prática, chegando a mandar esvaziarem os quatro pneus de quem estacionasse em locais proibidos ou colarem espessos papéis no vidro da frente, difíceis de remover, especificando a infração cometida pelo motorista.

O governador Abreu Sodré o contratou a peso de ouro para pôr ordem no trânsito caótico e congestionado de São Paulo. Eis como o jornalista e radialista Afanásio Jazadji evocou sua atuação, no Repórter Diário:

“O Coronel Fontenelle montou sua equipe e começou a trabalhar, localizando o engarrafamento em São Paulo em dois pontos: 1 - estacionamento desordenado nas principais ruas; e 2 – carga e descarga o dia todo, durante 24 horas, impedindo os carros de se locomoverem.

“Atacou logo os dois pontos com total sucesso, criando ‘bolsões’ e também ‘rotatórias’. Proibiu carga e descarga em toda a cidade, a não ser de meia-noite às 6 da manhã.

”Suas medidas radicais colocaram o trânsito no seu devido lugar. (...) Suas medidas atingiram os maiores empresários do setor de transportes, que com caminhões congestionavam praticamente o dia inteiro a região do Mercado Central, espalhando a paralisação por todo o centro e bairros adjacentes.

”Fontenelle mandava rebocar até mesmo o carro de vereadores e deputados que atravancavam tudo.”

O menestrel Juca Chaves chegou a compor uma sátira bem-humorada a seu respeito: “O Seu Fon-Fon chegou/ O Seu Fon-Fon chegou/ Mudou, mudou, mudou/ E agora, pra que lado eu vou?”.

Como havia muita grita contra Fontenelle, a deputada Conceição Costa Neves erigiu-se em porta-voz da oposição ao coronel, discursando inflamada e demagogicamente contra ele na Assembléia Legislativa. E a extinta TV Tupi (que fazia parte dos Diários e Emissoras Associados, de Assis Chateaubriand), armou um debate entre ambos, mediado por Aurélio Campos.

Sendo Fontenelle um homem irascível, a deputada populista supôs que sairia bem na foto se mostrasse coragem de confrontá-lo, adotando uma postura extremamente agressiva.

Para sua surpresa, o coronel se apresentou como um autêntico gentleman, recusando-se a acompanhá-la num duelo de agressões. Respondia às piores acusações e insultos com apenas quatro palavras: “Isso na sua opinião”.

As rudimentares pesquisas de opinião da época lhe deram a vitória por goleada. Os telespectadores ficaram chocados ao verem uma deputada se comportando de maneira tão vulgar e, embora estivessem (por influência da mídia) predispostos contra Fontenelle, acabaram por admirar sua postura cavalheiresca. Aos observadores mais atentos, entretanto, não escaparam sua testa franzida, a raiva a duras penas contida...
CRUCIFICADO PELA IMPRENSA


Menos sorte Fontenelle teve, entretanto, quando enfrentou a empresa Folha da Manhã, pertencente a Octávio Frias e Carlos Caldeira.

Ocorre que outro negócio de Caldeira era a Rodoviária de São Paulo, absurdamente localizada bem no centro da cidade (av. Duque de Caxias) e foco dos maiores congestionamentos. O trabalho de Fontenelle não estaria completo se não extirpasse essa chaga. E, como contrapartida à personalidade despótica, ele tinha muito senso do dever e coragem pessoal.

Percebendo que, se anunciasse antecipadamente a desativação da rodoviária, seria tolhido pela politicalha, Fontenelle a executou nos moldes de uma operação militar, pegando o inimigo desprevenido e criando um fato consumado: da noite de domingo para a manhã de segunda-feira, fechou a rodoviária e transferiu todos os ônibus, precariamente, para o Parque D. Pedro.

Foi vítima, como retaliação, de uma das mais repulsivas campanhas já desencadeadas por órgãos de imprensa contra um administrador público. Páginas e páginas eram utilizadas diariamente nos jornais do grupo para detonar o trabalho de Fontenelle e dar voz às suas vítimas, como os viajantes que perdiam o ônibus por desinformação.

Em nenhum momento os jornais tiveram a dignidade de informar aos leitores que estavam longe de ser parte isenta na questão, já que seus interesses haviam sido contrariados.

O governador Sodré, que não tinha a simpatia do Grupo Folhas, de repente acertou os ponteiros com Caldeira e Frias: demitiu Fontenelle e passou a receber rasgados elogios nos jornais da empresa.

Pouco tempo depois, ao dar uma entrevista no programa Roleta Paulista da então TV Paulista (Organização Victor Costa), Fontenelle foi indagado a respeito de sua demissão.. Em resposta, disse que iria falar tudo que até então silenciara sobre o comportamento desleal e indigno do governador.

De repente, parou, como se tivesse perdido o fio da meada. Fitou a câmara, seu olhar ficou esgazeado; cambaleou e, ao desabar no chão, já estava duro como pedra.

O pessoal do estúdio correu para socorrê-lo, a câmara tremeu, a transmissão foi interrompida. Logo depois, um locutor informou que o coronel tivera uma ligeira indisposição, mas passava bem.

Na verdade, estava agonizando. Morreu a caminho do pronto-socorro.

*Celso Lungaretti, jornalista e escritor. É autor do livro "Náufrago da Utopia" (sobre sua experiência durante a ditadura militar) e mantém blog homônimo. É colaborador e co-editor do "Quem tem medo do Lula?".

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