Ação redibitória neles
Quem começou a falar, escolhida por sorteio, foi a sogra do José Serra (PSDB), que é chilena. Ela fez revelação bombástica ‘al tirito nomás’, contando intimidades do genro...
Por José Ribamar Bessa Freire (*)
- "O debate entre as sogras dos candidatos deu o maior ibope. E, agora, doutor, como é que fica depois da liminar do Supremo Tribunal Federal (STF)? Será que os promotores do debate, que foram censurados, podem reclamar seus direitos entrando com algum tipo de ação legal?"
A pergunta, feita pelo acadêmico de direito ao seu professor, especialista em legislação eleitoral, recebeu resposta imediata:
- "Cerrrrrtamente, meu jovem. A liminar concedida na quinta-feira, 26 de agosto, pelo ministro Ayres Britto, permite impetrar uma ação redibitória. Digo mais: o impetrante pode ficar podre de rico, porque não se trata de uma açãozinha redibitoriazinha vagabundinha qualquer. Não! Aqui cabe, claramente, uma ação redibitória quanti minoris com pleno efeito repristinatório".
O diálogo acima só pode ser entendido se informamos como transcorreu o debate entre as sogras e o que é que ele tem a ver com a liminar do STF, esclarecendo ainda que diabo é uma ação redibitória.
Debate de sogras
O evento ficou conhecido no meio jurídico – eles metem o latim em tudo - como Discursio Jararacorum ou, em bom tucanês, Discursio Mater Matris Conjungium Candidatorum. “Esse sim vai pegar fogo, porque é um debate boca” – explicou José Simão, cuja coluna na Folha de São Paulo serviu de palco para o confronto.
Simão, que é o Esculhambador Geral da República, além de presidente de honra do PGN – Partido da Genitália Nacional – serviu de mediador. Quem começou a falar, escolhida por sorteio, foi a sogra do José Serra (PSDB), que é chilena. Ela fez revelação bombástica ‘al tirito nomás’, contando intimidades do genro:
- Sierra tiene explosiones intestinales, se tira cuescos fétidos en la hora del almuerzo. Es un pedorrero. Además, es un perdulario, cada vez que va al toilette gasta varios rollos de papel higiénico.
A sogra da Marina Silva (PV) também fez uma confissão que pode mudar o voto de muitos eleitores:
- Marina fazia fogueira na Amazônia quando criança, nas festas juninas.
Dilma (PT) levou vantagem. Casada duas vezes, ela já bateu de frente com duas sogras e, por isso, teve o dobro do tempo. “Sogra da Dilma é pleonasmo! A Dilma é a sogra do Brasil, no sentido atribuído por Dicró ao termo ” – comentou Simão. Já a mãe da mãe da mulher do candidato do PSOL fofocou sobre o Velhinho Traquinas:
“Quando o Plínio bebe mais de um copo de cerveja, fala se cuspindo todo, diz que seu sonho é ser fazendeiro no Mato Grosso pra plantar soja”.
A sogra do Eymael (PSDC) não hesitou em condená-lo por cultivar o hábito execrável de tirar cera do ouvido com tampinha de caneta bic: “Além disso, ele é caspento e tem chulé”.
A idéia de sogras na campanha eleitoral se alastrou pelo Brasil inteiro, convocando sogras federais, estaduais e municipais. A democracia ganha com uma interatividade maior com os eleitores. Enquanto no confronto só de candidatos, cada debatedor diz, hipocritamente, apenas aquilo que acha que o eleitor quer ouvir, no debate entre sogras é o eleitor que escolhe o que ele próprio quer ouvir, inventando o discurso das sogras. É, portanto, mais autêntico e altamente revelador.
Dessa forma, cada Estado pode organizar debates imaginários entre as sogras locais e, especialmente, ouvir a voz das ex-sogras. Em Minas Gerais, por exemplo, um deles já tem até nome de sogra: Anastasia. A sogra do outro, Hélio Costa (vixe vixe!), pode nos contar o que ele fazia com o Dan Mitrione na época da ditadura militar. Imagine a riqueza do discurso das sogras e ex-sogras de Collor (AL), de Alkmin (SP), da Mammy Murad, sogra e ex-sogra da Roseana Sarney!
No RS, o Tasso já é mesmo genro de todas, e no Ceará, o governador Ciro Gomes impetrou um habeas-sogra preventivo, quando levou a mãe de sua mulher para a Europa, com despesas pagas pelo contribuinte. No Amazonas, meu Deus do céu, o que diriam as sogras do Omar Aziz e do Alfredo Nascimento sobre seus respectivos genros? (Cartas para a redação).
Efeito Repristinatório
Acontece que a Lei das Eleições, em vigência desde 1º de outubro de 1997, em seu artigo 45, proíbe o humor em período eleitoral – atenção, só em período eleitoral - vetando qualquer gozação, sátira, ironia ou deboche com os candidatos. Portanto, sogras não podem debater, a regra é clara, como diz Arnaldo Cézar Coelho. A multa pra quem não respeitar a lei é de R$ 200 mil, levando um recuo de programas humorísticos como Casseta & Planeta, CQC e Pânico na TV. A eleição ficou triste, como denunciaram os manifestantes na passeata de protesto na orla de Copacabana, no Rio, domingo passado.
Mas desde a última quinta-feira, à noite, a situação mudou. O ministro Ayres Britto, do STF, aquele mesmo que deu razão aos índios no caso Raposa/Serra do Sol, atendeu em menos de 24 horas uma ação de inconstitucionalidade e concedeu liminar suspendendo a censura ao humor na campanha eleitoral. A ação vai ao pleno do STF na próxima quarta-feira para definir se o medo que o Poder tem do riso justifica a censura. Afinal, em que distúrbios gástricos e chulés de candidatos atentam contra a democracia? Por enquanto, vale a liminar de Ayres Britto, que argumentou:
- “O humor concorre, e muito, para o fortalecimento da democracia. Isso é sinal de maturidade democrática. Em todo o mundo, o humor é reconhecido como expressão de liberdade de imprensa. Criticar e ironizar são atividades inerentes ao humor. Programas humorísticos, charges e modo caricatural de pôr em circulação idéias, opiniões, frases e quadros espirituosos compõem as atividades de imprensa, sinônimo perfeito de informação jornalística A liberdade de imprensa livre não é de sofrer constrições em período eleitoral. Ela é plena em todo tempo, lugar e circunstâncias”.
Se o STF confirmar a liminar, os humoristas que foram prejudicados poderão entrar com uma ação redibitória. Quem diz isso? Não, não foi um especialista em legislação eleitoral, personagem inventado aqui tanto quanto o discurso das sogras. Trata-se apenas de uma lembrança dos meus tempos da Faculdade Nacional de Direito, onde estudei durante três anos num curso que não concluí. Lá, fui aluno relapso de Direito Civil de Clóvis Paulo da Rocha, que EM TODAS AS AULAS, só falava disso. Fui reprovado na prova em que ele perguntava o que é ação redibitória com efeito repristinatório.
Fiquei com traumas, mas encantado com a sonoridade das palavras "redibitória" e "repristinatório", que nunca esqueci. Até hoje não sei muito bem o que é isso. Redibir é anular judicialmente um contrato em que a coisa negociada foi entregue com vícios ou defeitos ocultos. Se for provado que uma das partes interessadas conhecia o vício, a outra pode entrar com uma ação redibitória de perdas e danos. É o caso do debate das sogras dentro da Lei Eleitoral. O macaco Simão vai ficar podre de rico, processando o Marco Maciel que assinou a lei, como presidente interino da República.
E o efeito repristinatório? Boa pergunta. Quando uma lei que revoga uma lei anterior é declarada inconstitucional, a primeira lei volta a ter a validade restaurada. É isso que se chama efeito repristinatório. A partir de agora, portanto, vale a lei anterior, ou seja, o deboche e a gozação. Atenção, sogras, ex-sogras, quase-sogras e futuras sogras de todos os candidatos do Brasil, entrem em ação: ação redibitória neles!
P.S. – Estou sendo processado por uma juíza do Amazonas. Ela também, a seu momento, terá a ação redibitória que merece. Para maiores informações, clicar em http://www.taquiprati.com.br/cronica.php?ident=148
*José Ribamar Bessa Freire é antropólogo, natural de Manaus e assina no “Diário do Amazonas” coluna semanal tida como uma das mais lidas da região norte. Reside no Rio de Janeiro há mais de 20 anos e é professor da UERJ, onde coordena o programa “Pró-Índio”. Mantém o blog “Taqui pra ti” e é colaborador do blog “Quem tem medo do Lula?”.A pergunta, feita pelo acadêmico de direito ao seu professor, especialista em legislação eleitoral, recebeu resposta imediata:
- "Cerrrrrtamente, meu jovem. A liminar concedida na quinta-feira, 26 de agosto, pelo ministro Ayres Britto, permite impetrar uma ação redibitória. Digo mais: o impetrante pode ficar podre de rico, porque não se trata de uma açãozinha redibitoriazinha vagabundinha qualquer. Não! Aqui cabe, claramente, uma ação redibitória quanti minoris com pleno efeito repristinatório".
O diálogo acima só pode ser entendido se informamos como transcorreu o debate entre as sogras e o que é que ele tem a ver com a liminar do STF, esclarecendo ainda que diabo é uma ação redibitória.
Debate de sogras
O evento ficou conhecido no meio jurídico – eles metem o latim em tudo - como Discursio Jararacorum ou, em bom tucanês, Discursio Mater Matris Conjungium Candidatorum. “Esse sim vai pegar fogo, porque é um debate boca” – explicou José Simão, cuja coluna na Folha de São Paulo serviu de palco para o confronto.
Simão, que é o Esculhambador Geral da República, além de presidente de honra do PGN – Partido da Genitália Nacional – serviu de mediador. Quem começou a falar, escolhida por sorteio, foi a sogra do José Serra (PSDB), que é chilena. Ela fez revelação bombástica ‘al tirito nomás’, contando intimidades do genro:
- Sierra tiene explosiones intestinales, se tira cuescos fétidos en la hora del almuerzo. Es un pedorrero. Además, es un perdulario, cada vez que va al toilette gasta varios rollos de papel higiénico.
A sogra da Marina Silva (PV) também fez uma confissão que pode mudar o voto de muitos eleitores:
- Marina fazia fogueira na Amazônia quando criança, nas festas juninas.
Dilma (PT) levou vantagem. Casada duas vezes, ela já bateu de frente com duas sogras e, por isso, teve o dobro do tempo. “Sogra da Dilma é pleonasmo! A Dilma é a sogra do Brasil, no sentido atribuído por Dicró ao termo ” – comentou Simão. Já a mãe da mãe da mulher do candidato do PSOL fofocou sobre o Velhinho Traquinas:
“Quando o Plínio bebe mais de um copo de cerveja, fala se cuspindo todo, diz que seu sonho é ser fazendeiro no Mato Grosso pra plantar soja”.
A sogra do Eymael (PSDC) não hesitou em condená-lo por cultivar o hábito execrável de tirar cera do ouvido com tampinha de caneta bic: “Além disso, ele é caspento e tem chulé”.
A idéia de sogras na campanha eleitoral se alastrou pelo Brasil inteiro, convocando sogras federais, estaduais e municipais. A democracia ganha com uma interatividade maior com os eleitores. Enquanto no confronto só de candidatos, cada debatedor diz, hipocritamente, apenas aquilo que acha que o eleitor quer ouvir, no debate entre sogras é o eleitor que escolhe o que ele próprio quer ouvir, inventando o discurso das sogras. É, portanto, mais autêntico e altamente revelador.
Dessa forma, cada Estado pode organizar debates imaginários entre as sogras locais e, especialmente, ouvir a voz das ex-sogras. Em Minas Gerais, por exemplo, um deles já tem até nome de sogra: Anastasia. A sogra do outro, Hélio Costa (vixe vixe!), pode nos contar o que ele fazia com o Dan Mitrione na época da ditadura militar. Imagine a riqueza do discurso das sogras e ex-sogras de Collor (AL), de Alkmin (SP), da Mammy Murad, sogra e ex-sogra da Roseana Sarney!
No RS, o Tasso já é mesmo genro de todas, e no Ceará, o governador Ciro Gomes impetrou um habeas-sogra preventivo, quando levou a mãe de sua mulher para a Europa, com despesas pagas pelo contribuinte. No Amazonas, meu Deus do céu, o que diriam as sogras do Omar Aziz e do Alfredo Nascimento sobre seus respectivos genros? (Cartas para a redação).
Efeito Repristinatório
Acontece que a Lei das Eleições, em vigência desde 1º de outubro de 1997, em seu artigo 45, proíbe o humor em período eleitoral – atenção, só em período eleitoral - vetando qualquer gozação, sátira, ironia ou deboche com os candidatos. Portanto, sogras não podem debater, a regra é clara, como diz Arnaldo Cézar Coelho. A multa pra quem não respeitar a lei é de R$ 200 mil, levando um recuo de programas humorísticos como Casseta & Planeta, CQC e Pânico na TV. A eleição ficou triste, como denunciaram os manifestantes na passeata de protesto na orla de Copacabana, no Rio, domingo passado.
Mas desde a última quinta-feira, à noite, a situação mudou. O ministro Ayres Britto, do STF, aquele mesmo que deu razão aos índios no caso Raposa/Serra do Sol, atendeu em menos de 24 horas uma ação de inconstitucionalidade e concedeu liminar suspendendo a censura ao humor na campanha eleitoral. A ação vai ao pleno do STF na próxima quarta-feira para definir se o medo que o Poder tem do riso justifica a censura. Afinal, em que distúrbios gástricos e chulés de candidatos atentam contra a democracia? Por enquanto, vale a liminar de Ayres Britto, que argumentou:
- “O humor concorre, e muito, para o fortalecimento da democracia. Isso é sinal de maturidade democrática. Em todo o mundo, o humor é reconhecido como expressão de liberdade de imprensa. Criticar e ironizar são atividades inerentes ao humor. Programas humorísticos, charges e modo caricatural de pôr em circulação idéias, opiniões, frases e quadros espirituosos compõem as atividades de imprensa, sinônimo perfeito de informação jornalística A liberdade de imprensa livre não é de sofrer constrições em período eleitoral. Ela é plena em todo tempo, lugar e circunstâncias”.
Se o STF confirmar a liminar, os humoristas que foram prejudicados poderão entrar com uma ação redibitória. Quem diz isso? Não, não foi um especialista em legislação eleitoral, personagem inventado aqui tanto quanto o discurso das sogras. Trata-se apenas de uma lembrança dos meus tempos da Faculdade Nacional de Direito, onde estudei durante três anos num curso que não concluí. Lá, fui aluno relapso de Direito Civil de Clóvis Paulo da Rocha, que EM TODAS AS AULAS, só falava disso. Fui reprovado na prova em que ele perguntava o que é ação redibitória com efeito repristinatório.
Fiquei com traumas, mas encantado com a sonoridade das palavras "redibitória" e "repristinatório", que nunca esqueci. Até hoje não sei muito bem o que é isso. Redibir é anular judicialmente um contrato em que a coisa negociada foi entregue com vícios ou defeitos ocultos. Se for provado que uma das partes interessadas conhecia o vício, a outra pode entrar com uma ação redibitória de perdas e danos. É o caso do debate das sogras dentro da Lei Eleitoral. O macaco Simão vai ficar podre de rico, processando o Marco Maciel que assinou a lei, como presidente interino da República.
E o efeito repristinatório? Boa pergunta. Quando uma lei que revoga uma lei anterior é declarada inconstitucional, a primeira lei volta a ter a validade restaurada. É isso que se chama efeito repristinatório. A partir de agora, portanto, vale a lei anterior, ou seja, o deboche e a gozação. Atenção, sogras, ex-sogras, quase-sogras e futuras sogras de todos os candidatos do Brasil, entrem em ação: ação redibitória neles!
P.S. – Estou sendo processado por uma juíza do Amazonas. Ela também, a seu momento, terá a ação redibitória que merece. Para maiores informações, clicar em http://www.taquiprati.com.br/cronica.php?ident=148
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