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domingo, 11 de julho de 2010

Democracia de araque

Democracia de araque

Por Mario Augusto Jakobskind (*)

Enquanto a Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP) se manifesta quase diariamente contra supostas restrições à liberdade de imprensa na Venezuela, Bolívia, agora Equador e a legislação midiática aprovada na Argentina, o mesmo tom não é adotado em países como o México, onde o panorama nesse campo é bastante desabonador. A grande mídia conservadora prefere seguir os passos da SIP e não proclama editoriais para denunciar o que está ocorrendo no país governado por Felipe Calderón.

E o que está acontecendo nas plagas astecas? Um das questões diz respeito às verbas publicitárias do Estado. As publicações que não rezam pela cartilha de Calderón não recebem publicidade estatal. Mais de cem cerraram suas portas e outras são obrigadas a despedir jornalistas por não terem como arcar com as despesas de contratação dos trabalhadores.

A Revista Mexicana de Comunicação, com 26 anos de existência, é um dos exemplos concretos da ação do caldeirismo, ou seja, por ter uma linha editorial crítica e de análise sobre o bom comportamento de certos órgãos de imprensa em relação ao Presidente Calderón, o governo mexicano ordenou a suspensão da publicidade para o órgão de imprensa agora ameaçado de fechamento.

Também no México, que vive uma guerra de máfias, dezenas de jornalistas foram assassinados nos últimos tempos e dificilmente os responsáveis pela violência são punidos. Na época da hegemonia do Partido Revolucionário Institucional, o PRI, que governou o México seguidamente por mais de meio século, jornalistas que cobriam as esferas do poder recebiam a cada fim de ano um envelope com dinheiro. Quem não seguisse a rotina se via ameaçado de perder o emprego e se fosse mais ousado, a própria vida. Pode-se imaginar o tipo de cobertura que ocorria nos referidos espaços.

Com Calderón, cujo Partido Ação Nacional, desde o anterior Presidente Vicente Fox, se apresentava como alternativa “moralizadora” e tudo mais, praticamente nada mudou, quem não reza pela cartilha do PAN corre o risco de perder publicidade necessária para a continuidade da publicação.

Mas a SIP não está nem aí, muito menos em relação ao que ocorreu na semana que passou na CNN, onde a editora sênior para assuntos do Oriente Médio, Octavia Nasr, foi sumariamente demitida por ter elogiado o guia espiritual do Hezbollah, Mohammed Hussein Fadlallah, morto há poucos dias. Nasr desagradou o lobby judaico e o governo Obama, que consideravam o clérigo um “terrorista”.

Por falar em Oriente Médio, a rádio do Exército de Israel, segundo divulgou o jornal Ha’aretz, o Estado hebreu enviou documentos secretos aos Estados Unidos confirmando a assinatura de um acordo de cooperação nuclear entre os dois países. Pelo acordo, os EUA se comprometem a vender a Israel materiais para produzir energia, tecnologia nuclear e outros suprimentos. E isso apesar de Israel não ter assinado o Tratado de não Proliferação Nuclear. Vários países se recusaram a fazer acordo com Israel exatamente por isso, mas Washington ignorou o fato.

Especialistas asseguram que Israel agora fica no mesmo patamar da Índia e do Paquistão, que não assinaram o Tratado e têm a bomba atômica.

Ao mesmo tempo em que isso acontece, Madame Hillary Clinton correndo o mundo continua a demonizar o Irã por causa da energia nuclear. Clinton removeu montanhas para que o Conselho de Segurança das Nações Unidas aprovasse as sanções contra Teerã, já o aliadíssimo Israel...

Enquanto a Justiça argentina julga o ditador Rafael Videla por mais assassinatos durante os anos de chumbo na Província de Córdoba foi divulgada a informação segundo a qual entre militares e civis 779 são acusados de cometerem crimes de lesa humanidade na ditadura militar entre 1976 e 1983. Entre eles 464 estão detidos, sendo que mais da metade se encontram em unidade penitenciárias e 39% em prisão domiciliar. Mais de 300 ainda estão para ser indiciados.

No Chile, o general da reserva Manuel Contreras, ex-chefe da polícia políitica do ditador Augusto Pinochet foi condenado a cumprir 20 anos de prisão pelo assassinato em Buenos Aires do general Carlos Prats e senhora Sofia Kuthbert. O assassino Contreras, responsável por outras mortes, tem 81 anos e vai morrer na prisão.

Já no Brasil, entretanto, o papo é outro, pois os ministros do Supremo Tribunal Federal decidiram que a anistia decretada em 1979, em plena ditadura, contempla a quem cometeu crimes contra a humanidade.


Em tempo: Lula fez um gol de placa ao sugerir que a CBF promovesse eleição pelo menos de oito em oito anos para a presidência da entidade. Pois é, que história é essa de a Era Ricardo Teixeira se eternizar? E agora Teixeira está fazendo lobby dos grupos que querem privatizar os aeroportos. A Argentina fez isso com Carlos Menem e os serviços pioraram. Por aqui, as privatizações em setores vitais só fizeram também piorar os serviços. Mas a grana é alta e contempla os lobistas


*Mário Augusto Jakobskind é jornalista, mora no Rio de Janeiro e é correspondente no Brasil do semanário uruguaio Brecha. Foi colaborador do Pasquim, repórter da Folha de S. Paulo e editor de Internacional da Tribuna da Imprensa. Integra o Conselho Editorial do semanário Brasil de Fato. É autor, dentre outros livros, de “América que não está na mídia” e “Dossiê Tim Lopes – Fantástico / Ibope”. É colunista do site “Direto da Redação” e colaborador do blog “Quem tem medo do Lula?”.

Charges: Carlos Latuff e Bira Dantas, respectivamente.

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