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domingo, 28 de março de 2010

Explicando o boicote brasileiro no exterior

[caption id="attachment_5030" align="aligncenter" width="183" caption="Bandeira dos Emigrantes"][/caption]

Explicando o boicote


Por Rui MartinsBerna (Suiça)


Exmo. Sr. Presidente da República


O movimento de cidadania Estado do Emigrante (que não é Ong, não tem e nem pediu verbas, funciona na base do voluntariado), sucessor do movimento Brasileirinhos Apátridas (que deu dores de cabeça ao MRE ao denunciar e lutar contra o risco de uma geração de brasileirinhos sem nacionalidade, situação resolvida com a Emenda constitucional 54/07) vem à sua presença explicar porque decidiu boicotar o alistamento eleitoral dos emigrantes nos Consulados, no Exterior, e porque poderá pedir aos emigrantes para não votarem nos Consulados e boicotarem as próximas eleições presidenciais.


Mas Senhor Presidente não se assuste com nossa ameaça. Ela não causará grandes estragos.


Por uma razão bem simples – nós somos os excluídos do Exterior, não temos nenhuma importância política e a grande maioria, mesmo sem que decretemos boicote, já não vota. Na sua reeleição, em 2006, por exemplo, havia 4 milhões de emigrantes espalhados pelo mundo, mas só havia 80 mil eleitores emigrantes (!) e metade deles justificou ausência e não votou.


E é por isso que lhe escrevemos – os emigrantes brasileiros, que o MRE chama com o nome bonito de Brasileiros no Mundo, embora mandem 7 bilhões de dólares anuais à Matriz brasileira, não têm grandes direitos e não participam da vida política brasileira. E, por isso, ninguém se interessa em votar - pegar o carro, um trem, avião, gastar dinheiro duramente ganhado, para votar no Consulado mais próximo mas sem poder escolher representantes em Brasília, não paga a pena.


Mesmo porque não existe também até agora uma política nacional da emigração. É verdade, durante seu governo, criou-se uma Subsecretaria-geral das Comunidades Brasileiras no Exterior, montou-se um Portal Consular na Internet e se fizeram duas Conferências dos ditos Brasileiros no Mundo, no Itamaraty. Graças a um abaixo-assinado por iniciativa do nosso movimento criou-se uma Comissão de Transição, que virou Conselho de Representantes mas sem nenhum poder decisório, que qualificamos de vaquinha de presépio.


Não é isso que reivindicamos. Queremos alguma coisa concreta, como existe em outros países. Portugal, por exemplo, cuja população emigra desde a época de Vasco da Gama e de Cabral, tem uma experiência que levou a criar uma verdadeira política de emigração.


Existe um Ministério das Comunidades, são eleitos quatro deputados representando as quatro regiões do mundo povoadas com emigrantes portuguêses e elege-se um amplo Conselho Consultivo dos emigrantes com 63 representantes. Com essa estrutura, Portugal desenvolve toda uma política social, cultural, educativa junto aos emigrantes.


Mas não é só Portugal, com ligeiras variantes o mesmo acontece na França, Itália e mesmo em países latinoamericanos como o México e o próprio Equador.


Os emigrantes constituem uma população nacional externa, mas não é por isso que devem ser considerados como parte das funções das Relações Exteriores. Devem ser considerados como um segmento da população brasileira e possuir em Brasília uma Secretaria Especial de Estado ou um Ministério, autônoma e independente do MRE (por que não um super Ministério englobando migração, imigração e emigração?), ter parlamentares emigrantes e um amplo Conselho Consultivo de emigrantes.


Se tivermos parlamentares emigrantes, nossos representantes em Brasília, haverá interesse na comunidade do exterior pelo alistamento eleitoral, transferência do título de eleitor e pelo exercício do voto. Os partidos também darão importância política aos emigrantes e instalarão seus comitês e farão campanha no Exterior. E os emigrantes poderão levar suas reivindicações a Brasília, por seus representantes eleitos por voto direto.


Como vê, nossas reivindicações são justas e, se incorporadas neste final do seu governo, assinalarão uma nova política de emigração. E, tão logo seja anunciada essa sua intenção, suspenderemos o boicote e colaboraremos no alistamento eleitoral.


Receba Excia nossos cumprimentos, na expectativa de que dê provimento a estas reivindicações.


PS. se o MRE confirmar eleição do Conselho de Representantes de emigrantes em maio, o fato de ser apenas consultivo não responderá nossas reivindicações. Participaremos dessa eleição e do registro dos emigrantes, muitos não-documentados, pela Internet para poderem votar, mas não incentivaremos a transferência de títulos de eleitor e nem o alistamento eleitoral, enquanto não houver eleições para parlamentares emigrantes irem a Brasília.


Rui Martins é jornalista. Foi correspondente do Estadão e da CBN, após exílio na França. É autor do livro “O Dinheiro Sujo da Corrupção”, criador dos "Brasileirinhos Apátridas" e da proposta de um Estado dos Emigrantes. É colunista do site "Direto da Redação" e vive em Berna, na Suíça, de onde colabora com os jornais portugueses Público e Expresso, e com o blog "Quem tem medo do Lula?"

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